02 fevereiro, 2014

COM JESUS NO CORAÇÃO OU O RETRATO DE ANA E SIMEÃO



1. A Igreja Una e Santa celebra no dia 2 de Fevereiro, quarenta dias depois do Natal, a Festa da Apresentação do Senhor, que as Igrejas do Oriente conhecem por Festa do Encontro (Hypapantê) e dos Encontros: Encontro de Deus com o seu Povo agradecido, mas também de Maria, de José e de Jesus com Simeão e Ana. Também connosco.

 2. Quarenta dias depois do seu nascimento, sujeito à Lei (Gálatas 4,4), Jesus, como filho varão primogénito, é apresentado a Deus, a quem, sempre segundo a Lei de Deus, pertence. De facto, o Livro do Êxodo prescreve que todo o filho primogénito, macho, quer dos homens quer dos animais, é pertença de Deus (Êxodo 13,11-13), bem como os primeiros frutos dos campos (Deuteronómio 26,1-10).

 3. É assim que, para cumprir a Lei de Deus, quarenta dias depois do seu nascimento, Jesus é levado pela primeira vez ao Templo, onde, também pela primeira vez, se deixa ver como a Luz do mundo e a nossa esperança.

 4. Compõe a cena um velhinho chamado Simeão, nome que significa «Escutador», que vive atentamente à escuta, em Hi-Fi, alta-fidelidade, alta frequência, alta definição, amor novo, e que o Evangelho apresenta como um homem justo e piedoso, que esperava a consolação de Israel. Ora, esse velhinho que vivia à espera e à escuta, com premurosa atenção e coração vigilante, veio ao Templo sob o impulso do Espírito (en tô pneúmati). Fica aqui declarada a qualidade da energia e da alegria que move o velho e querido Simeão: não é movido a carvão, nem a água, nem a vento, nem a petróleo e seus derivados, nem a electricidade, nem a energia nuclear. Simeão é movido pelo Espírito Santo. Maneira novíssima de viver, pausa e bemol na nossa impetuosidade, na nossa vontade de aparecer e de fazer, pausa e bemol nos nossos protagonismos e vontade de poder. Falamos quase sempre antes do tempo, e não chegamos a dar lugar à suave voz do Espírito. Na verdade, adverte-nos Jesus: «Não sois vós que falais, mas o Espírito Santo» (Marcos 13,11; cf. Mateus 10,20; Lucas 12,12). Portanto, é urgente esperar! Regressemos, pois, à beleza de Simeão. Ao ver aquele Menino, recebeu-o carinhosamente nos braços. Por isso, os Padres gregos dão a Simeão o título belo de Theodóchos [= «recebedor de Deus»]. É então que Simeão entoa o canto feliz do entardecer da sua vida, um dos mais belos cantos que a Bíblia registra: «Agora, Senhor, podes deixar o teu servo partir em paz, porque os meus olhos viram a tua salvação, que preparaste diante de todos os povos, Luz que vem iluminar as nações e glória do teu povo, Israel!» (Lucas 2,29-32).

 5. E, na circunstância, também uma velhinha chegou carregada de Graça e de Esperança. Chamava-se Ana, que significa «Graça». É
dita «Profetisa», isto é, que anda, também ela, sintonizada em Hi-Fi, alta-fidelidade, com a Palavra de Deus escutada, vivida e anunciada. Diz ainda o texto que era filha de Fanuel, nome que significa «Rosto de Deus», e que era da tribo de Aser, que quer dizer «Felicidade». Tanta intimidade com Deus! Também esta velhinha, serena e feliz, com 84 anos, número perfeito de números perfeitos (7 x 12), teve a Graça de ver aquele Menino. E diz bem o texto do Evangelho que Ana «falava daquele Menino a todos os que esperavam a libertação de Jerusalém» (Lucas 2,38). Outra vez a beleza inteira do díptico do Evangelho de Lucas: Simeão e Ana. Simeão esperava e Ana anunciava. Eis aqui presente, nestes dois maravilhosos velhinhos, a inteira Escritura dos dois Testamentos, e o retrato a corpo inteiro do Consagrado, que, na Bíblia hebraica, se diz Nazîr, um nome passivo e receptivo, totalmente dedicado a Deus, conduzido por Deus, «compondo» com emoção os acontecimentos de Deus.

 6. Esta é a Festa da Alegria e da Esperança acumulada e realizada. É a Festa da Luz. Simeão e Ana viram a Luz e exultaram de Alegria. Hoje somos nós que nos chamamos Simeão e Ana. Somos nós que recebemos esta Luz nos braços, e que ficamos a fazer parte da família da Felicidade e a viver pertinho de Deus, Rosto a Rosto com Deus, Escutadores atentos do bater do coração de Deus, movidos pelo Espírito de Deus, Recebedores de Deus, Anunciadores de Deus. Rezamos hoje para que, nesta sociedade de coisas e de números (cf. Isaías 5,8), os Consagrados vivam cada vez mais Rosto a Rosto com Deus, e dêem testemunho no mundo deste Dom maravilhoso.

 7. Por isso e para isso é que Ele vem, conforme a lição de Malaquias 3,1-4 e Hebreus 2,14-18. Vem de Deus, mas senta-se connosco. Em tudo semelhante aos seus irmãos. Lava-nos os pés e a alma. Apaga os nossos pecados. Põe-nos em comunhão com Deus. Tanta proximidade faz deste Dia a Festa do Encontro.

 8. Não nos conformemos, pois, com as pedras e as pautas deste mundo (Romanos 12,2). Experimentemos viver em Hi-Fi, alta frequência, alta-fidelidade, alta dedicação, amor novo. Anda por aí uma música nova à nossa espera. É como um som que nunca se ouviu, como um silêncio que nunca se calou! Que Maria, a Mãe da Alegria, nos leve pela mão e nos ensine a subir e a descer a escadaria do coração.


 D. António Couto, in Mesa de Palavras

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