«Foi para a liberdade que Cristo nos
libertou. Permanecei, pois, firmes, e não vos sujeiteis outra vez ao jugo da
escravidão. Irmãos, de facto, foi para a liberdade que vós fostes chamados. Só
que não deveis deixar que essa liberdade se torne numa ocasião para os vossos
apetites carnais. Pelo contrário: pelo amor, fazei-vos servos uns dos outros. É
que toda a Lei se cumpre plenamente nesta única palavra: Ama o teu próximo como
a ti mesmo. Mas, se vos mordeis e devorais uns aos outros, cuidado, não sejais
consumidos uns pelos outros. Mas eu digo-vos: caminhai no Espírito, e não
realizareis os apetites carnais. Porque a carne deseja o que é contrário ao
Espírito, e o Espírito, o que é contrário à carne; são, de facto, realidades
que estão em conflito uma com a outra, de tal modo que aquilo que quereis, não
o fazeis. Ora, se sois conduzidos pelo Espírito, não estais sob o domínio da
Lei» (Gl 5,1.13-18).
Enquadramento
e contexto da passagem
Estamos perante um texto que
aparece na parte final da Carta aos Gálatas. É o começo de uma reflexão acerca
da verdadeira liberdade, que é fruto do Espírito (cf. Gl 5,1-6,10). Para melhor
compreensão da mensagem, torna-se conveniente perguntar-nos pelo problema
fundamental aí tratado: esta comunidade cristã está a ser incomodada por um
grupo de judaízantes, isto é, cristãos provenientes do judaísmo, gente ainda
agarrada à antiga lei, concretamente às suas regras, normas, disposições e
práticas exteriores, as quais consideram também necessárias para chegar à vida
em plenitude ou à salvação; e Paulo – para quem Cristo basta e para quem as
obras da Lei já não dizem nada – procura fazer com que toda a comunidade não se
sujeite mais a nenhum tipo de escravidão.
Ensinamento
As palavras do apóstolo são um convite
enérgico à liberdade. Ele avisa os Gálatas que foi para a liberdade que Cristo
os libertou (a repetição destina-se a dar ao verbo “libertar” um sentido mais
intenso) e que não convém recair no jugo da escravidão (Paulo identifica essa
escravidão com a Lei e a circuncisão). Mas o que vem a ser a liberdade para o
cristão? Será que tem a ver com a faculdade de optar entre duas coisas
distintas e opostas? Não. Será que tem a ver com uma espécie de independência
ético-moral, em virtude da qual cada um pode fazer o que lhe dá na gana, sem
impedimentos de qualquer espécie? Também não. Para Paulo, a verdadeira
liberdade consiste em viver no amor. O que nos escraviza, nos limita e nos
impede de atingir a vida em plenitude ou a salvação é o egoísmo, o orgulho, a
auto-suficiência; mas vencer esse fechamento em nós próprios e fazer da nossa
vida um dom de amor torna-nos autenticamente livres. Só é verdadeiramente livre
aquele que se libertou de si próprio e vive para se dar aos outros. Como é que
esta “liberdade” (a capacidade de amar, de dar a vida) nasce em nós? Ela nasce
da vida que Cristo nos dá: pela adesão a Cristo, gera-se em cada pessoa um
dinamismo interior que a identifica com Cristo e lhe dá uma capacidade infinita
de amar, de ultrapassar o egoísmo, o orgulho e os limites. É o Espírito que
alimenta, dia a dia, essa vida de liberdade (ou de amor) que se gerou em nós, a
partir da nossa adesão a Cristo. Viver na escravidão é continuar a viver uma
vida centrada em si próprio (cf. 5,19-21); viver na liberdade (“segundo o
Espírito”) é sair de si e fazer da sua vida um dom, uma partilha (cf. 5,22-23).
Acolher o ensinamento
Os homens da nossa época anseiam
por esse valor chamado “liberdade”; contudo, têm, frequentemente, uma ideia
bastante egoísta deste valor essencial. Quando a liberdade se entende desde o
eu, identifica-se com libertinagem: é a capacidade de eu fazer o que quero; é a
capacidade de eu poder escolher; é a capacidade de eu poder tomar as minhas decisões
sem que ninguém me entrave… Esta liberdade não provoca, tantas vezes, orgulho,
egoísmo, auto-suficiência, isolamento e, portanto, escravidão? Para Paulo, só
se é verdadeiramente livre quando se ama. Aí, eu não me prendo a nada do que é
meu, deixo de viver obcecado comigo e com os meus interesses e estou sempre
disponível para me partilhar com os meus irmãos. É esta experiência de
liberdade que faz hoje tanta gente que não reserva a própria vida para si
própria, mas faz dela uma oferta de amor aos irmãos mais necessitados. Como dar
este testemunho e passar esta mensagem aos homens do nosso tempo, sempre obcecados
com a verdadeira liberdade? Como dar a saber que só o amor nos faz totalmente
livres?
Orar com o ensinamento
Pe. Vasco
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