1. No programa de «preparação» para a Noite Pascal Baptismal, início e meta da vida cristã, o Domingo III da Quaresma está marcado pelos primeiros «escrutínios» para os catecúmenos: primeira «chamada» para a Liberdade.
2. No Evangelho deste Domingo III da Quaresma (Lucas 13,1-9), Jesus atira tudo contra o nosso coração empedernido: atira a crónica e a parábola. Tudo serve para gravar em nós a conversão. A crónica refere a brutalidade de Pilatos que massacrou um grupo de Galileus e a queda da torre de Siloé que matou 18 pessoas. Pois bem, Jesus não se insurge contra o poder romano nem invoca o fatalismo, mas também não desperta sentimentalismos fáceis e de ocasião, nem tão-pouco se refugia em esquemas feitos: pecaram e por isso foram castigados. Jesus não fica a olhar para trás, não é reactivo, mas proactivo. Vira a inteira crónica para nós e diz que, face à precariedade da vida, só nos resta converter-nos! Lição oportuna para nós, que perdemos ainda muito tempo a comentar as notícias, sempre trágicas, dos jornais. De forma diferente, da crónica Jesus retira sabiamente a conversão, grande tema quaresmal, que nos acompanha desde Quarta-Feira de Cinzas.
3. Depois pega na parábola da figueira, talvez com muitas folhas, mas sem figos. E põe em cena aquele belo acerto de contas entre o dono do pomar (o Pai) e o cultivador (Jesus, o Filho). Os «três anos» apontam para o ministério de Jesus. Aqueles «três anos» de cuidados parece que não foram suficientes para levar aquela figueira, que somos nós, a dar frutos. É-nos dado «ainda mais um ano» de graça para frutificar. Não, não é a paciência de Deus que a parábola acentua, mas a urgência da nossa conversão. A parábola constitui, portanto, um fortíssimo apelo à conversão.
4. Extraordinária a história de Moisés (Êxodo 3,1-8 e 13-15). Moisés é pastor e tem um caminho a seguir: o caminho das suas ovelhas. Mas vê uma Visão grande e nova: uma sarça que arde, mas não se consome. E diz o texto, na versão original, que, para ver melhor, Moisés se «desviou do caminho» para ver melhor aquela visão grande. O caminho de Moisés era o caminho das ovelhas que pastoreava. Ao sair, Moisés age como uma criança curiosa e deslumbrada! Mas as crianças são louvadas no Evangelho, e todos somos advertidos que, se não nos tornarmos como as crianças, não entraremos no Reino de Deus (Marcos 10,14-15). E Deus, que habitava naquela «chama que chama», contou-se a Moisés: 1) Eu BEM VI o sofrimento do meu povo; 2) e OUVI os seus clamores; 3) CONHEÇO a situação; 4) DESCI a fim de o libertar e conduzir para a terra da liberdade. Está aqui, nestes quatro VERBOS, a história de Deus, a santidade de Deus, que SAI DE SI para vir ao nosso encontro. Note-se bem que contando-se nestes verbos, Deus se afasta dos ídolos, que a Escritura Santa diz que não vêem, nem ouvem… E um pouco depois, ao dizer o seu NOME, Deus diz-se outra vez, não com um nome estático, mas com um verbo na forma activa: «Eu Sou». Outra vez diferente dos ídolos inúteis, vazios e inactivos.
5. É importante não deixarmos para trás, no esquecimento, um versículo que a lição de hoje de Êxodo 3 omitiu: o versículo 10. Aí, Deus diz a Moisés: «E agora VAI; Eu te envio ao Faraó, e FAZ SAIR do Egipto o meu povo, os filhos de Israel». Ficamos então a saber que Deus, que está bem atento a todos as situações difíceis dos seus filhos, nunca responde alguma coisa… Deus nunca responde alguma coisa. Deus responde sempre ALGUÉM! Aqui, nesta situação de opressão do seu povo no Egipto, a resposta de Deus é Moisés. E hoje, quem é hoje a resposta de Deus para as situações difíceis do mundo hoje? Sem equívocos: a resposta de Deus hoje somos nós!
6. A reflexão que Paulo nos oferece neste Domingo III da Quaresma (1 Coríntios 10,1-6.10-12) é exemplar e encaixa perfeitamente com o Evangelho. No deserto, o Povo conduzido por Deus e por Moisés foi rodeado de tantas provas de carinho e da presença amorosa de Deus. Todavia, pecaram, entorpeceram os corações, puseram em causa a presença de Deus… Conclusão: caíram mortos no deserto! E Paulo escreve, por duas vezes neste texto, para nossa advertência: «Estas coisas aconteceram para nos servir de exemplo» (1 Coríntios 10,6 e 11), acrescentando logo: «E foram escritas para nossa instrução». (1 Coríntios 10,11).
D. António Couto, in Mesa de Palavras
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