31 março, 2013

«Não nos ardia cá dentro o coração?!»




Queridos irmãos e irmãs carmelitas, a minha saudação pascal! É tempo de Páscoa, é tempo de reconhecer que, no caminho de cada dia, não caminhamos sós, mas há Alguém que discretamente caminha ao nosso lado. Estamos acompanhados por Jesus Ressuscitado que dá um sentido novo à nossa existência! Os discípulos de Emaús também se sentiram acompanhados. Reconheceram Jesus na Fracção do Pão e partilharam um com o outro: «Não nos ardia cá dentro o coração!?».
A celebração da eucaristia é um mistério de luz e de amor. É mistério de luz porque ao partir o Pão, a luz do Ressuscitado invade o nosso coração e na Sua luz abrem-se os nossos olhos que começam a ver o que antes estava velado; é mistério de amor, porque em cada eucaristia, o nosso coração é invadido pelas torrentes da caridade divina do próprio amor de Jesus ressuscitado!
O encontro com Jesus, o acolhimento da Sua amizade e companhia introduziu rupturas na vida dos discípulos de Emaús que estavam de costas voltadas para a comunidade. Consciencializaram a profunda tristeza e desilusão em que estavam mergulhados e arrepiaram caminho, mudaram de sentido, deixaram a direcção de Emaús, símbolo do individualismo solitário e triste, e voltaram-se para Jerusalém; partiram ao encontro da comunidade dos discípulos, recuperando a alegria e o entusiasmo. Na verdade, o encontro com Jesus cria a necessidade do encontro e comunhão com os outros discípulos para partilhar e celebrar a alegria numa comunidade de fé, de vida e de amor.
Ao partirmos o pão quotidiano em cada eucaristia, também nós somos empurrados pelo Ressuscitado para fora de nós mesmos, para fora da casa fechada do nosso egoísmo e enviados para a comunidade - o lugar da comunhão, da festa e do amor partilhado, o lugar onde se encarna a comunidade trinitária sobre a terra!
Nós, carmelitas, somos homens e mulheres que vivem o seguimento de Jesus Cristo formando comunidades que se alimentam do essencial cristão pela escuta da Palavra de Deus, pela experiência pascal, pela fé no Crucificado e Ressuscitado, pelo tom carismático que a Virgem Maria e os nossos fundadores nos legaram. As nossas comunidades, sejam de consagrados ou de fiéis leigos, hão-de ser centros de irradiação da fé, do amor e da compaixão de Deus, traduzidos em obras e gestos salvíficos.
Hoje, a Igreja identifica particulares sinais de esperança com a eleição do Papa Francisco. Os seus primeiros gestos e palavras interpelam a grande comunidade de comunidades que é a Igreja. A aparição deste pastor universal à frente da Igreja traz-nos um convite à pobreza, à simplicidade e radicalidade evangélicas. Convida-nos a reconhecer Jesus nos caminhos e nas pousadas, a deixarmo-nos invadir pela luz e amor do Ressuscitado e a partir em direcção aos outros, à comunidade, levando a alegria transbordante da fé pascal. A fidelidade transparente ao Evangelho sensibiliza, arrasta, dá esperança a crentes e não crentes, toca e aquece os corações… Saibamos ler estes sinais programáticos que evangelizam por irradiação e pelo testemunho.
E nós, carmelitas, como é que nos situamos diante desta evidência que a frescura do Evangelho incarnado exerce? De que estamos à espera? Também nós precisamos de devolver à Igreja, à nossa Ordem, às nossas comunidades e às nossas vidas pessoais o verdadeiro rosto de Cristo Ressuscitado com o fermento transformador do Seu Evangelho. Os hábitos, os rituais, a idade, os costumes, as estruturas tendem a arrastar-nos para uma certa mediocridade, rotina e conformismo, perdendo a relevância do poder desafiante de Jesus. Não nos acomodemos, deixemos Emaús e partamos para Jerusalém!
O Papa Francisco na sua Missa inaugural exortava-nos: «Não devemos ter medo da bondade, ou mesmo da ternura. (…) A ternura (…) não é a virtude dos fracos, antes pelo contrário denota fortaleza de ânimo e capacidade de solicitude, de compaixão, de verdadeira abertura ao outro, de amor. Não devemos ter medo da bondade, da ternura!» A ternura e a bondade são a face visível do amor invisível que arde no nosso coração e nas nossas comunidades.
            Estimados irmãos e irmãs carmelitas, consagrados e seculares, demo-nos conta como também o nosso coração arde na presença do Ressuscitado. Reconheçamo-Lo e convertamo-nos de novo a Ele e à vida em comunidade. Regressemos, depois de cada eucaristia, a Jerusalém, à comunidade, ao encontro com os outros discípulos de Jesus nesta vinha do Carmelo. Na partilha dos bens morais, intelectuais, materiais e, sobretudo, espirituais descobriremos o enorme potencial evangelizador da comunidade. É a partir de uma forte experiência de fraternidade que podemos partir para a missão, que seremos capazes de saltar para as periferias, indo de encontro aos que estão longe geográfica, afectiva e espiritualmente, edificando, nos gestos concretos de amor, na comunidade e na missão, o grande Corpo da Igreja, presente em toda a terra.
            Neste Dia de Páscoa e em todo o tempo pascal deixemo-nos atingir pela luz e calor da Ressurreição rezando com o Papa Bento XVI: «A explosão da vossa Ressurreição, Senhor, agarrou-nos no Baptismo para nos atrair. A vossa Ressurreição alcançou-nos e agarrou-nos. Senhor ressuscitado, a Vós nos agarramos, sabendo que nos segurais firmemente, mesmo quando as nossas mãos se debilitam. Agarrados à Vossa mão, Senhor, seguramos também, as mãos uns dos outros, tornamo-nos um único corpo», nesta grande comunhão de todos os baptizados (cf. Bento XVI, Homilia, 15 de Abril de 2006). Guardai-nos, Senhor, nesta grande comunhão de família cristã e carmelita e dai-no-la a saborear, desde já, na beleza de cada Liturgia celebrada, como antegozo da eternidade que nos espera!

Que Jesus Ressuscitado vos aqueça e ilumine o coração!
Santa Páscoa! Abraço-vos a todos com amizade, Pe Joaquim Teixeira, prov.

Sem comentários:

Enviar um comentário