14 abril, 2013

PEDRO, O LUME NOVO, A REFEIÇÃO NOVA, O AMOR MAIOR




1. A oposição luz – trevas atravessa de lés a lés o inteiro texto do IV Evangelho. A Luz verdadeira que vem a este mundo para iluminar todos os homens é Jesus (João 1,9). Sem esta Luz que é Jesus, andamos às escuras, na noite, na dor, no fracasso, na incompreensão. É assim, narrativamente – e, portanto, exemplarmente, para nós, leitores –, com Nicodemos, que anda de noite (João 3,2), com Judas, o homem da noite que tudo anoitece à sua volta  (João 13,30; 18,3), com os sete dicípulos da cena de hoje que trabalharam toda a noite, sem sucesso (João 21,3).



2. Mas Jesus aparece de madrugada na praia, no limiar do dia e da alegria, aqui perto, a cem metros de nós. Com os olhos embotados pela doença do escuro, não O reconhecemos à primeira. Mas ouvimos a Sua voz carregada de verdade, que nos desvenda («Não tendes nada para comer, pois não?» (João 21,5) e nos aponta rumos verdadeiros («Lançai a rede para a direita da barca, e encontrareis») (João 21,6). Não o reconhecemos à primeira. Mas vemos e lemos os Sinais. «É o Senhor», diz para Pedro o discípulo, aquele que Jesus amava (João 21,7). E Pedro correu na direcção de Jesus. Os outros seis vieram também, arrastando a barca carregada de peixes.

3. E sobre a praia o lume novo e a refeição nova, cuidadosamente preparada por Jesus (João 21,9). Agora Pedro está no lugar certo, com Jesus, e aquece-se no lume vivo, que é Jesus. Belo e exemplar contraponto: pouco antes, narrativamente falando, Pedro estava com os guardas, que andavam na noite, e aquecia-se a outro lume, aceso na noite, pelos guardas (João 18,18). Tinha rompido a sua intimidade com Jesus. Mas agora arrasta a rede cheia com 153 grandes peixes. E o narrador refere, chamando a nossa atenção, que, embora fossem muitos, a rede não se rompeu (João 21,11). «Romper» traduz o verbo gregoschízô, donde vem etimologicamente «cisma». É, portanto, de comunhão e de unidade que se trata, e não de «cismas», dissensões, divisões. O número 153 ajuda a ler esta «comunhão», se quisermos ver nesse número a gematria, ou tradução em números, da locução hebraica qahal ha’ahabah [= «comunidade do amor»], excelente maneira de dizer a realidade nova e bela da Igreja.

4. E é sobre o amor o diálogo que se segue entre Jesus e Pedro: «Pedro, amas-me mais…?», pergunta Jesus por três vezes. E por três vezes Pedro responde que sim, ouvindo de Jesus, também por três vezes a nova missão de «Pastor» que lhe é confiada: «Apascenta as minhas ovelhas» (João 21,15-17). Entenda-se bem que as ovelhas nunca deixam de ser pertença de Jesus Ressuscitado. E a afirmação por três vezes do amor de Pedro a Jesus recompõe a intimidade rompida por Pedro com aquelas três negações um pouco antes narradas (João 18,17-27).

5. Senhor, ensina a tua Igreja de hoje outra vez a ver e a ler os Sinais da Tua presença na madrugada e na praia, novo limiar de luz e de esperança que orienta a nossa vida toda para Ti, referência fundamental do amor e da comunhão que deve unir como uma rede a Tua Igreja. Precede-nos e preside-nos sempre. Não nos deixes perdidos no nevoeiro e na confusão, na noite e no frio, a orientar-nos por outro farol, a aquecer-nos a outro lume. Faz que reconheçamos sempre a Tua voz de Único Verdadeiro Pastor, e ampara os pastores que incumbiste de apascentar as tuas ovelhas.

6. A lição do Livro dos Actos dos Apóstolos (5,27-41) mostra-nos os Apóstolos como testemunhas do Ressuscitado. Cheios do Espírito Santo, intrépidos, sem medo, e com alegria grande, enchem Jerusalém com o nome de Jesus. Extraordinária provocação para nós, que temos tanta cidade e tantos corações â nossa espera.

7. Jesus é a testemunha fiel (Apocalipse 1,5), porque diz o que ouviu dizer ao Pai e faz o que viu fazer ao Pai. Por isso, todas as criaturas o aclamam, como refere a lição de hoje do Livro do Apocalipse (5,11-14).
D. António Couto, In Mesa de Palavras

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