Durante os seguintes Domingos do presente ano litúrgico, seremos acompanhados pelo evangelista Lucas. É, portanto, lógico que, no início do tempo comum, nos seja proposto o prólogo ou introdução deste Evangelho.
O prólogo de Lucas revela-nos o sentido dos evangelhos. São os relatos da experiência de fé das primeiras comunidades cristãs a partir da Ressurreição de Jesus. Por isso, os evangelhos constituem uma mensagem baseada no passado, interpretada à luz do presente (a vida das primeiras comunidades) e com perspectivas para o futuro (a Igreja posterior). Também São Lucas dedica o seu evangelho ao "excelentíssimo Teófilo", nome que significa “amigo de Deus”, por tanto, nele cada um de nós pode e deve sentir-se incluído e interpelado. Os evangelhos são uma "boa notícia" para nós, homens e mulheres do século XXI.
A segunda parte do trecho Evangélico de hoje está separada do prólogo por três capítulos. Deste modo, ouvimos parte do capítulo quatro, onde nos é apresentado o início da vida pública de Jesus.
Jesus, na sinagoga de Nazaré, recebe a Palavra, proclama-a ao povo, recolhe o livro e anuncia a actualidade da Palavra. Mas, de facto, o próprio Jesus é a Palavra anunciada pelos profetas, por isso, Ele pôde dizer que “hoje” se cumpriu a Palavra anunciada já há tantas gerações. Na verdade, a Igreja proclama Jesus Cristo como o Salvador dos homens, ontem, hoje e sempre.
O papa Bento XVI diz, a este respeito, que “a Igreja não vive de si mesma mas do Evangelho e dele tira sempre de novo a orientação para o seu caminho. Trata-se – continua a dizer o Papa – de uma observação que cada cristão deve acolher e aplicar a si mesmo: só quem se coloca antes de tudo à escuta da Palavra de Deus pode depois tornar-se anunciador. De facto, ele (o cristão) não deve ensinar a sua própria sabedoria, mas a sabedoria de Deus, que muitas vezes, aos olhos do mundo, parece loucura. A Igreja e a Palavra de Deus estão inseparavelmente ligadas entre si. A Igreja vive da Palavra de Deus e a Palavra de Deus ressoa na Igreja, no seu ensinamento e em toda a sua vida” – conclui o Papa.
Por conseguinte, é indispensável ter presente que a Palavra de Deus é um dos principais pilares da nossa fé cristã, porque sem a Palavra proclamada e explicada a fé não amadurece. Torna-se assim compreensível que é fundamental, para aprofundar na nossa vida cristã, escutar e assimilar a Palavra que Deus nos revelou, por meio do seu Filho, Jesus Cristo.
Por isso, ser cristão e “anunciar hoje a Palavra” não é somente uma questão de palavras e discursos sugestivos; exige, simultaneamente, compromisso. O “anúncio” da boa notícia não é simplesmente transmitir informação, mas fazer, construir, lutar contra o mal, curar, reabilitar os irmãos, colocar-se ao seu serviço, acompanhar e dignificar a vida como manifestação da mão criadora de Deus. E somente assim a “evangelização” hoje será como a de Jesus que veio a fazer maravilhas em favor dos pobres, atribulados e cativos.
Este Domingo convida-nos a recomeçar de novo o projecto de vida cristã que queremos dar aos nossos dias. E a melhor forma é começar por aprender a escutar e acolher a Palavra de Deus, a exemplo de Nossa Senhora que guardava e meditava a Palavra no seu coração. Mas, depois, uma vez assimilada, essa Palavra deve tornar-se vida na nossa vida, pois “felizes os que escutam e cumprem a Palavra”.
O convite que o evangelho nos faz hoje, é aprofundar com seriedade e constância a riqueza da palavra de Deus, porque somente meditando-a e interiorizando-a, aprenderemos a vive-la quotidianamente. Deus continua a falar ao nosso coração por meio da sua palavra, e a palavra tem como missão alimentar o nosso caminho de fé, que iniciámos no dia do nosso Baptismo. Porque, como diz Santo Agostinho, a Deus falamos-lhe quando rezamos, mas é Ele que nos fala quando lemos e ouvimos a sua palavra.
Em suma, sejamos atentos e dóceis à Palavra que Deus nos quis confiar. Não tenhamos medo das suas exigências. Se permanecermos fiéis aos compromissos do nosso Baptismo nunca deixaremos de levar Jesus Cristo aos outros. Esta é a missão que “hoje” nos faz concretizar a Palavra anunciada a todos os povos. Daí que são Paulo, na segunda leitura, falando dos carismas, sublinhe a importância primordial que deve ser dada ao anúncio da palavra de Deus.
Que a nossa vida cristã seja concretizada na alegria da fé que brota da Palavra de Deus. Só assim nos tornamos testemunhas de Jesus Cristo diante do mundo que nos desafia e interroga.
Jesus resumiu o seu projecto em poucas palavras: libertação das pessoas de toda espécie de escravidão. Mas, a libertação integral do homem não se consegue senão à base de amor e perdão, tolerância e liberdade, respeito pela dignidade da pessoa, serviço à verdade e à vida, fraternidade e solidariedade.
Hoje, somos nós, cristãos que devemos continuar a levar por diante o anúncio de esperança e o mesmo tipo de acção de Jesus.
Deixemo-nos conduzir pela Palavra de Deus, para caminhar com decisão para Cristo.
P. Vítor Hidalgo López